Matriz Elétrica Brasileira – Chegou, finalmente, a vez das Pequenas Centrais Hidrelétricas? Artigo por Ademar Cury da Silva (ABRAPCH)

Matriz Elétrica Brasileira – Chegou, finalmente, a vez das Pequenas Centrais Hidrelétricas? Artigo por Ademar Cury da Silva (ABRAPCH)

 

PCHs e CGHs estão sendo melhor avaliadas qualitativamente no planejamento, porém muito mais do que reconhecer o seu valor, é necessário viabilizar sua inserção maciça no mercado de energia.

Vencida a maior crise hídrica da história do Setor Elétrico Brasileiro (SEB), muitas lições foram aprendidas, mas muitas outras ainda precisam ser entendidas, especialmente quando se trata das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e Usinas Hidrelétricas de maior porte (UHEs).

 

Os Reservatórios esvaziam ciclicamente e este é um dos principais motivos de suas existências. Sua função, porém, só se mantem se novos reservatórios forem implantados, com prioridade para reservatórios de cabeceira e com distribuição geográfica preferencial para regiões com uma menor quantidade de reservatórios existentes, se UHEs e PCHs forem construídas, preferencialmente em cascata em cada rio, otimizando assim o uso da mesma água, tudo na proporção do aumento da demanda de energia e, principalmente, para contrabalançar a inserção crescente de
fontes renováveis com alta intermitência, como a energia das fontes eólica e solar, limpa e renovável, mas que tem geração de energia variável no tempo…

 

Como ocorre naturalmente, a falta de ventos e sol ao longo das 24 horas do dia impõe uma complementação com características de reservação, como é o caso das baterias. Vale salientar, então, que os reservatórios de água são as melhores, mais baratas e menos poluentes baterias disponíveis hoje. Em sistemas híbridos, como o Sistema Interligado Nacional (SIN), ainda se poderia e deveria estudar, complementarmente, um programa consistente de UHEs (e até PCHs) reversíveis.

 

Esta falta de novas usinas hidrelétricas com reservatórios de acumulação, custou, na última crise hídrica, valores que, segundo a Secretária Executiva do MME, Marisete Pereira, ultrapassaram R$ 20 bilhões, custo assumido por consumidores e usuários desta importante e estratégica commoditie. Recursos financeiros estão sendo malversados em combustíveis fósseis, que, se investidos em usinas hidrelétricas, com antecedência e planejamento, trariam empregos e investimentos bilionários e 100% nacionais, em empreendimentos com duração de mais de 100 anos, trazendo
melhores resultados para o setor e tarifas de energia mais baixas, e tudo isso com a fonte de geração que tem a menor pegada de carbono, a hidrelétrica.

 

Apesar de quase todos reconhecerem esta premissa, muito pouco foi feito nos últimos anos e muito menos está previsto no planejamento para os próximos, como pode ser constatado na proposta do PDE 2031, em discussão. Nem novas UHEs, muito menos reservatórios e poucas PCHs e CGHs.

 

Na análise que a ABRAPCH fez do PDE 2031, o que resultou em contribuição formal na CP 119 do MME, constatamos que as PCHs e CGHs estão sendo melhor avaliadas qualitativamente no planejamento, porém muito mais do que reconhecer o seu valor, é necessário viabilizar sua inserção maciça no mercado de energia, pois a fonte hídrica representa a única solução possível para resolver o problema do desequilíbrio estrutural das diversas fontes disponíveis para ampliação da oferta de energia na próxima década. Nossas contribuições, neste sentido, deverão se estender a outros órgãos de governança do setor elétrico, MME e ANEEL, além do Congresso Nacional.

 

A seguir, apresentamos argumentos e propostas que permitem antecipar a resposta à pergunta do título deste texto: sim, chegou a vez das PCHs e CGHs!

 

O próprio texto da proposta do PDE cita: “o potencial existente e os benefícios proporcionados pelo desenvolvimento das usinas hidrelétricas de pequeno porte (PCHs e CGHs), com vasto elenco de empreendimentos ainda não aproveitados, também é considerado no PDE. Os diversos benefícios para a matriz elétrica brasileira, como as
sinergias com outrasfontesrenováveis(eólica, biomassa e fotovoltaica) e, principalmente, flexibilidade operativa e de armazenamento no horizonte operativo de curto prazo deverão se tornar mais evidentes com a implantação do preço horário e a futura criação de mecanismos de remuneração pela capacidade”.

 

Aos benefícios citados acrescentamos sustentabilidade, segurança, confiabilidade, com geração, na maioria das vezes, próxima à carga e, portanto, com redução de perdas e menores investimentos em transmissão, tecnologia 100% nacional, desenvolvimento científico/tecnológico. Isto sem falar dos diversos benefícios ambientais, menores prazos de implantação, geração de empregos no país, oferecimento de espaços para piscicultura, capacidade de regularização das vazões dos rios, irrigação e abastecimento humano, com reflexos nos setores agropecuário e de abastecimento humano e saneamento básico.

 

O PDE sinaliza o acréscimo de 5,2 GW de UHEs, a partir de 2026, a maior parte proveniente de repotenciação e modernização, além de algumas UHEs com pouca viabilidade econômica e ambiental e 3.3 GW de PCHs, sendo 0,5 GW em construção, acréscimo de novos 0,8 GW até 2026 (menos do que os 2 GW previstos na Lei nº 14.182 de capitalização da Eletrobrás) e 400 MW anuais a partir de 2027.

 

Esta expansão indicativa da fonte hidráulica para os próximos 10 anos é extremamente reduzida, tendo em vista a estimativa das fontes solar e eólica, com 52 GW (incluindo a GD) e térmicas, com acréscimo de potência líquido de 15,5 GW (descontadas as desativações).

 

Aceitar tal proposta de matriz elétrica significa concordar com um crescimento de térmicas no sistema, sempre mais caras e poluentes que as hidráulicas, maior do que o necessário e assumir riscos elevados de pagar, em um futuro próximo, outros 20 bilhões de Reais, ou mais, em combustíveis poluentes que novamente irão onerar indevidamente o consumidor e prejudicar o meio ambiente com emissões de gases de efeito estufa. Ou se viabilizam novos investimentos em reservatórios e hidroelétricas (e, no médio prazo, só restaram as PCHs) ou, então, não será possível a desativação prevista das térmicas fósseis, e deveremos preparar o bolso para pagar tarifas de energia mais altas e mais bandeiras tarifárias vermelhas.

 

Assim sendo, nossa proposta ao PDE, que será também incorporada às demandas da ABRAPCH aos demais órgãos do setor, sugere o seguinte cronograma de nova PCHs e CGHs: 300 MW para geração em 2023, 400 MW em 2024, 500 MW em 2025, 800 MW em 2026 (atendendo assim o previsto na Lei nº 14.182) e 1.000 MW/ano a partir de 2027, totalizando 7.000 MW até o final da década.

 

Para que seja possível a implantação deste programa de PCHs e CGHs, algumas providências adicionais precisam ser discutidas e implementadas, em paralelo e com urgência:

 

  • Reconhecimento e precificação dos atributos, inclusive ambientais, definição, valoração e correta distribuição dos diversos usos múltiplos da água e maior isonomia tributária e de incentivos em relação às outras fontes, para a
    viabilização comercial dos projetos disponíveis;

 

  • Solução do problema dos entraves ambientais – contrapartidas ambientais precisam ser compatíveis com os eventuais danos – com uma mudança radical e urgente dos processos ambientais que precisa ser defendida por instituições e investidores e implementadas de imediato;

 

  • Viabilização de formas alternativas de comercialização da energia das PCHs, tendo em vista que os leilões tradicionais podem ser muito limitados, como consequência do crescimento da GD e abertura do mercado e a redução das necessidades das distribuidoras, além de considerar as PCHs como elegíveis (o que efetivamente são) para contratação e fornecimento de energia de reserva;

 

  • Revisão do mecanismo de definição de garantias físicas, cálculo do PLD, GSF e outros custos relacionados com a operação das hidrelétricas, compatibilizando-os com as particularidades das PCHs, considerando os usos compartilhados dos reservatórios e compensando prejuízos decorrentes das falhas de planejamento do SEB no passado, entre outros;

 

  • Um amplo programa de construção de PCHs e CGHs, de âmbito nacional, precisa ser desenvolvido e incentivado, se necessário, com subsídios que compensem atributos, externalidades, e distorções atuais do mercado, o que trará uma distribuição de investimentos e empregos pelo país e, dada a diversidade pluviométrica, representaria um reservatório equivalente, com todas as suas vantagens operativas – vale registrar que outras fontes contam com estes subsídios, muitas vezes não explícitos, salientando-se o setor do petróleo, como já comentado anteriormente;

 

  • Consolidar o entendimento sobre a importância das CGHs na Geração Distribuída. Além de serem elegíveis para projetos de GD, nas modalidades de autoconsumo remoto e geração compartilhada, são fontes naturalmente distribuídas geograficamente e que podem trazer uma compensação para a intermitência da fonte solar e eólica. Projetos híbridos deveriam ser estimulados;

 

  • Maior e melhor uso da modalidade já existente de Geração Distribuída por Chamada Pública, que permite a contratação de até 10% do consumo das distribuidoras, através de geração de fonte renovável em sua área de concessão.

 

É urgente a mobilização da sociedade brasileira, através de seus órgãos institucionais, legislativos, regulatórios, econômicos, comerciais e representativos para a busca de um SEB melhor e mais barato. Na opinião da ABRAPCH, é imprescindível um programa significativo e abrangente de construção de novas PCHs.

 

Conforme as considerações acima, PCHs não são e nunca foram um problema.

 

São, sim, a solução para o problema real da atual e futura matriz elétrica brasileira.

 

Ademar Cury da Silva é Diretor da ABRAPCH.

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